Até porque maternidade percorre caminhos compulsórios para nós e dificilmente para os homens
Recebi mensagem de uma mãe dizendo que se a mulher disse sim à maternidade, ela que arque com as abdicações trazidas junto com o bebê, afinal, segundo o remetente, já era sabido que sofreríamos renúncias, portanto devemos simplesmente aguentar. No mesmo dia, vídeo no qual um sujeito propaga a ideia da exigência do não uso da camisinha em relacionamentos ditos como sérios, viralizou nas redes sociais. Conforme o (des)influenciador, preservativo é falta de respeito com o homem e "antibiológico".
Tá, Jéssica, mas o que tem a ver uma coisa e outra? Tudo! Segue o fio: você, mulher, sabe muito bem que a resistência ao uso da camisinha é real e certamente já caiu na cilada de ceder à pressão de transar sem usá-la, certo? Se colocou em risco não só a gravidez, mas a inúmeras doenças sexualmente transmissíveis.
Suponhamos que numa dessas acabou ficando grávida. O cara, obviamente, vai te culpar por não ter tomado pílula ou feito tabelinha, mesmo esses métodos não sendo 100% seguros. Antes de evaporar, vai te dizer que não está pronto para ser pai e até quem sabe sugerir aborto. Porém, além de toda autocondenação sobre o tema, sabemos que no Brasil é crime interromper uma gestação (salvo casos de estupro, feto anencéfalo ou quando há risco de morte para a mãe). Então o único caminho é ter o bebê sozinha.
E aí, minha amiga, é ladeira abaixo. A mesma sociedade que defende que a mulher se submeta às vontades masculinas - já que quem não tem em casa vai buscar na rua - irá te condenar por não ter se prevenido, mesmo que você tenha o feito e caído no percentual de falha. A placa de 'mãe solteira' será pendurada no seu pescoço e virão questionamentos de todas as formas: não viu que o cara não prestava? Tá vendo o que acontece com mulher que não se dá ao respeito? Você acabou com a sua vida, e agora?
Enquanto isso o bonito que não quis colocar o bendito preservativo já estará em outro relacionamento ou aproveitando a vida por aí, mas, coitado, né? Não estava pronto pra ser pai! O indivíduo não sofrerá qualquer tipo de cobrança ou punição por abandonar o próprio bebê. A vida seguirá completamente normal para ele.
E aí quando seu filho nascer e você mergulhar de fato no mar aberto da maternidade, não poderá falar absolutamente nada, caso contrário, junto com o puerpério, o baby blues, a privação de sono e liberdade, virá também um turbilhão de julgamento e o que vai ecoar mais alto será: você disse sim à maternidade, agora aguente!
Quando na real você confiou numa relação e atendeu às expectativas de nunca frustrar um homem e agora está sozinha no subsolo do efeito cascata, sentindo o peso de cada camada cair sobre suas costas.
Daí eu te pergunto: toda mulher diz sim à maternidade por livre e espontânea vontade e consciente das consequências? Esta mais do que óbvio que não, né?
Com isso, mulheres, quero dizer que a maternidade percorre caminhos compulsórios para nós e dificilmente para eles. Portanto, não importa o que te digam, não tenha medo de dizer um belo e sonoro NÃO quando for pressionada a ceder por convenções sociais. Acredite, ninguém destas pessoas estará ao seu lado quando a corda arrebentar. Previna-se de tudo: doenças, pessoas, julgamentos e principalmente de armadilhas do patriarcado!
(*) Jéssica Benitez é jornalista, mãe do Caetano e da Maria Cecília e aspirante a escritora no @eeunemqueriasermae.
Comentários