Em discursos para manifestantes nesta terça-feira (7) em Brasília e em São Paulo, o presidente Jair Bolsonaro fez ameaças golpistas ao Supremo Tribunal Federal (STF) e a integrantes da Corte, em especial ao ministro Alexandre de Moraes.
Alexandre de Moraes incluiu Bolsonaro no inquérito das fake news, que apura a divulgação de informações falsas. A decisão do ministro atendeu a um pedido aprovado por unanimidade pelos ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Nesta segunda (6), em outro inquérito, Moraes determinou prisões e buscas e apreensões contra envolvidos em atos antidemocráticos.
Bolsonaro afirmou que não vai mais cumprir as decisões de Moraes e defendeu o "enquadramento" do ministro. "Ou esse ministro [Alexandre de Moraes] se enquadra ou ele pede para sair. Não se pode admitir que uma pessoa apenas, um homem apenas turve a nossa liberdade. Dizer a esse ministro que ele tem tempo ainda para se redimir, tem tempo ainda de arquivar seus inquéritos. Sai, Alexandre de Moraes", afirmou o presidente em São Paulo.
Mais cedo, em Brasília, sem citar nominalmente Moraes, Bolsonaro disse que ou o ministro se "enquadra" ou "esse poder pode sofrer aquilo que nós não queremos".
"Não podemos continuar aceitando que uma pessoa específica da região dos três poderes continue barbarizando a nossa população. Não podemos aceitar mais prisões políticas no nosso Brasil. Ou o chefe desse poder enquadra o seu ou esse poder pode sofrer aquilo que nós não queremos", disse o presidente.
Em nota, o Supremo informou que se manifestará sobre as falas de Bolsonaro nesta quarta-feira (8), por meio de seu presidente, ministro Luiz Fux, no início da sessão da Corte.
Reações
Veja como reagiu o mundo político, juristas e outras autoridades:
Partido Social Liberal (PSL) e Democratas (DEM ): Em nota conjunta, as legendas afirmaram: O PSL e o DEM entendem que a liberdade é o principal instrumento democrático e não pode ser usada para fins de discórdia, disseminação de ódio, nem ameaças aos pilares da própria democracia. Por isso, repudiamos com veemência o discurso do senhor presidente da República ao insurgir-se contra as instituiç?es de nosso país.
Movimento Democrático Brasileiro (MDB): "O MDB respeita divergências programáticas, mas se aferra à Constituição que determina a independência harmônica entre os poderes. Contra isso, o próprio texto constitucional tem seus remédios em defesa da democracia, que é sinônimo da vontade do povo".
Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB): "O presidente do PSDB, Bruno Araújo, convoca reunião Extraordinária da Executiva para esta quarta-feira (8), para diante das gravíssimas declarações do presidente da República no dia de hoje, discutir a posição do partido sobre abertura de impeachment e eventuais medidas legais".
Camilo Santana (PT) - governador do Ceará: "Essas ameaças de tom golpista tentam demonstrar força mas, ao contrário, só revelam a fraqueza e o desequilíbrio de quem as faz. Mostram desprezo às leis e à Constituição. Tentam provocar o caos para tirar o foco dos reais problemas do país e da total incapacidade de resolvê-los".
João Doria (PSDB) - governador de São Paulo: "Minha posição é pelo impeachment do presidente Jair Bolsonaro - depois do que ouvi hoje ele claramente afronta a Constituição".
Eduardo Leite (PSDB) - governador do Rio Grande do Sul: "Foi um erro colocar Bolsonaro no poder. Está cada vez mais claro que é um erro mantê-lo lá".
Flávio Dino (PSB) - governador do Maranhão: "A última vez que um presidente da República resolveu “enquadrar' e colocar nos “eixos' ministros do Supremo foi em 16 de janeiro de 1969, sob a ditadura do AI-5, com a cassação de Hermes Lima, Victor Nunes Leal e Evandro Lins e Silva".
Rodrigo Pacheco (DEM-MG) - presidente do Senado: "Ao tempo em que se celebra o Dia da Independência, expressão forte da liberdade nacional, não deixemos de compreender a nossa mais evidente dependência de algo que deve unir o Brasil: a absoluta defesa do Estado Democrático de Direito".
Jean Paul Prates (PT-RN) - líder da minoria no Senado: "Bolsonaro definitivamente perdeu as condições de governar, de recuperar a economia e o Brasil. Só restam duas alternativas para Bolsonaro depois do dia de hoje, renúncia ou impeachment. Como ele não é capaz desse gesto pela nação, já passa da hora de o Congresso conduzir o processo de impeachment do presidente".
Randolfe Rodrigues (Rede-AP) - senador e líder da oposição no Senado: "Superaremos esse tempo, página infeliz da nossa história! O verdadeiro patriota se compadece de seus compatriotas. Se compadece quando seu compatriota sente fome, adoece. O povo brasileiro é DIVERSIDADE, e não desunião. Apesar deles, amanhã há de ser outro dia!"
Baleia Rossi (MDB-SP) - deputado federal e presidente nacional do MDB: "São inaceitáveis os ataques a qualquer um dos poderes constituídos. Sempre defendo a harmonia e o diálogo. Contudo, não podemos fechar os olhos para quem quem afronta a Constituição. E ela própria tem os remédios contra tais ataques".
Simone Tebet (MDB-MS) - senadora e Líder da bancada feminina no Senado: "Resposta ao grito de hoje do PR [presidente], recheado de insinuações, ameaças e ações constantes contra a ordem democrática e as liberdades públicas: CN [Congresso Nacional] está vigilante e tem instrumento constitucional para conter qualquer tentativa de retrocesso".
Roberto Freire (Cidadania-SP) – deputado federal e presidente nacional do Cidadania: “Se tinha dúvida, Arthur Lira viu agora com o discurso na Paulista que não há acordo possível com golpista. Golpista não tem palavra. Bolsonaro deu um chapéu em Lira: atacou STF e urnas eletrônicas. Um comício delinquente bancado com dinheiro público. IMPEACHMENT JÁ, deputado!"
Marcelo Freixo - deputado federal e líder da Minoria na Câmara (PSB-RJ): "Dirigentes partidários e líderes na Câmara e Senado precisam construir imediatamente uma aliança em defesa da democracia. Bolsonaro está desesperado, dobrou a aposta na violência e o Congresso tem a obrigação de reagir p/ proteger a legalidade. O campo democrático é maioria".
Alessandro Vieira (Cidadania-SE) - senador e líder do Cidadania no Senado: "A lei 1079 define os crimes de responsabilidade do Presidente da República. No seu art 4º, VIII, fala exatamente do não cumprimento de decisões judiciais. A pena é perda do cargo (impeachment) e dos direitos políticos por até 5 anos".
Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra): “As decisões judiciais devem ser cumpridas e que constitui crime de responsabilidade de um mandatário incitar o seu descumprimento, fazendo referência expressa ao Supremo Tribunal Federal. Ninguém, nem qualquer autoridade está acima da Lei e de decisões judiciais. Ademais, o respeito às regras democráticas é fortalecido pelo seu exercício regular'.
Juiz Federal Eduardo André Brandão – presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe): “O presidente da República agiu de forma irresponsável e deu um péssimo exemplo ao pregar desobediência à determinações judiciais e, mais uma vez, lançar ataques pessoais a ministros do Supremo Tribunal Federal. As decisões judiciais são passíveis de recursos e podem ser impugnadas, conforme prevê a legislação processual. Portanto, é preciso repudiar discursos de ameaça ou de ódio contra qualquer magistrado. Atitudes desarrazoadas como essa afrontam as instituições da República e atentam contra a estabilidade democrática. Nesse momento, nosso país precisa de pacificação e respeito às leis, sobretudo aos mandamentos constitucionais, para enfrentar os efeitos da pandemia da Covid e a crise econômica, impulsionada pela alta da inflação e crescente desemprego'.
Wálter Maierovitch – jurista: “O Bolsonaro está dizendo que ele quer tudo dentro das quatro linhas, dentro da Constituição, mas dentro da Constituição dele, da interpretação dele. Quer dizer, o que ele não acha que está na Constituição, ele acusa o outro, quando é ele que está contra a Constituição. Pro Bolsonaro, a Constituição é ele, é o que ele acha, e não é isso. Ele ataca um ministro e fala em tirar o ministro, ora, os ministros do Supremo, assim como todos os magistrados, são vitalícios, só por impeachment se pode isso".
Carlos Ayres de Britto - ministro aposentado e ex-presidente do STF: “Nas quatro linhas da Constituição, há dois protagonistas estatais por definição, são os que primeiros que entram no campo para jogar: por essa ordem, artigo segundo, o Legislativo e o Executivo. Um terceiro que entra em campo é como um árbitro, como juiz dessa partida, e o juiz é o poder Judiciário. Ora, quando essas decisões são tomadas, o que cabe ao poder Executivo é respeitar, as regras do jogo são essas, estão na Constituição. Em nenhum dispositivo da Constituição, o presidente da República enquadra membro do poder Judiciário, menos ainda ministro do Supremo e o Supremo como um todo. Os ministros do Supremo e o Supremo como um todo é que podem enquadrar membros do poder Executivo, isso está na Constituição."
Celso de Mello – ministro aposentado e ex-presidente do STF: “Essa conduta de Bolsonaro revela a figura sombria de um governante que não se envergonha de desrespeitar e vilipendiar o sentido essencial das instituições da República! É preciso repelir, por isso mesmo, os ensaios autocráticos e os gestos e impulsos de subversão da institucionalidade praticados por aqueles que exercem o poder!'.
Marina Silva - ex-ministra do Meio Ambiente e ex-candidata a presidente da República: "Bolsonaro sempre demonstrou não ter limite mas Brasil o limitará, sem dúvida! Não vamos abrir mão da democracia por causa de um delírio ditatorial. Não adianta recorrer a uma suposta coragem para desafiar as instituições. Ele não passa de um autoritário irresponsável. Chega!".
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